domingo, 5 de agosto de 2012

TRAIÇÃO (CAP. 1 DE 3)


O casal estava no carro. Ele dirigia em silêncio. Ela o observava com o canto do olho, incomodada. Desconfiada.

Já fazia algum tempo que seu parceiro se comportava de maneira estranha. Luciano estava arredio. Nos últimos dias vinha evitando a companhia de Adele. Coisas simples que faziam juntos como ir ao supermercado ou à academia agora eram quase raridade.

Eles estavam juntos há 3 anos. Foi amor à primeira vista. Luciano, 12 anos mais moço, não titubeou em pegar suas coisas e ir morar com Adele, no seu belo apartamento. E mesmo com toda a diferença de idade, o casal tinha um ótimo relacionamento.

Ele não era mais o mesmo desde a Páscoa, dois meses antes. A rotina do casal começou a ser alterada quando o Luciano passou a chegar mais tarde do escritório. Muito trabalho, alegava. Adele sempre acreditou. Advogado no início de carreira, ela sabia o quanto o companheiro lutava para conquistar seu espaço profissional no mercado. Nunca reclamou por ele chegar tarde. Pelo contrário, até o apoiou.

De uma hora para outra o sexo começou a ficar escasso, frio. Foi nesse momento que Adele sentiu o sinal de alerta acender. Sexo entre eles sempre fora sagrado. A química entre os dois era notável. Adele nunca sentira tanto prazer na sua vida com outro homem antes dele. E sabia que Luciano também adorava fazer amor com ela. Mas de repente ele passou a negar fogo. Muito trabalho, estresse. A justificativa era essa.
Naquela noite ambos seguiam para o aniversário da prima de Adele. Depois de muita conversa, ela conseguiu fazer com que Luciano a acompanhasse. E ali estavam os dois no carro. Mudos. Adele tentou puxar assunto, alguma coisa banal. Ele respondeu aos monossílabos, ligeiramente irritado.

“Ele tem outra”.

Até então aquela ideia terrível não havia passado pela sua cabeça. Aliás, ela fizera força para expulsar qualquer desconfiança. Mas não teve jeito. A suspeita da traição caiu como uma bomba sobre ela ali mesmo no carro. E Adele quase se sufocou. Será? Será que Luciano teria coragem de fazer uma sacanagem monstra com ela, depois de tudo o que viveram juntos? Mesmo depois de todo o apoio que ela lhe deu, tanto profissionalmente como financeiramente? Seria possível?

Adele chegou a sentir náuseas ao imaginar essa hipótese. Mesmo que fosse apenas uma suposição, somente em pensar que estava perdendo sua paixão para outra mulher era algo devastador. Adele sabia que o seu amor por ele era muito maior do que o dele por ela. Mas isso nunca importou. Desde que estivessem juntos, é claro.
Luciano deixou o carro com o manobrista e os dois entraram no elevador. Ele continuava mudo, tentando disfarçar a contrariedade.
− O que houve, Lu? – ela perguntou respirando fundo, com medo da resposta – Você está esquisito.
− Só estou cansado – Luciano olhou para o relógio – Você pretende ficar muito tempo aqui?
Aborrecida, Adele respondeu:
− É o aniversário da minha prima. Pensei em me divertir um pouco, já que faz tanto tempo que não saímos e não fazemos nada de diferente.

Era uma cobrança, a primeira de todas. Adele ficou esperando ansiosa por uma resposta, qualquer que fosse, mas Luciano ficou mudo outra vez. Aquele silêncio era deprimente.

Assim que entraram no apartamento onde acontecia a festa, Luciano tratou de se afastar para ir pegar uma bebida. Adele logo encontrou alguns conhecidos e tentou relaxar. Seu companheiro sumiu. O lugar era grande e havia muitas pessoas. Ansiosa, Adele o procurou com os olhos, mal prestando atenção no que seus amigos diziam. Ria de coisas que nem sabia se eram engraçadas. Bebeu duas taças de champanha de um gole só. Onde estava ele? Onde Luciano tinha se metido?

De repente a prima de Adele a puxou pelo braço dizendo:
− Venha comigo, quero lhe mostrar o que o Rodolfo me deu de presente.
Zuleica a conduziu entre os convidados até seu quarto. De Luciano, nem sinal. Quando se viram ambas sozinhas, Zuleica fez a pergunta:
− O que está acontecendo, afinal? Você está se sentindo bem?
− É o Luciano – Adele queria se embebedar – Ele está muito esquisito. Não sei o que fazer.
− Esquisito como?
− Esquisito, Zuleica! Estranho demais! –ela fez uma pausa e confessou envergonhada – Acho que ele tem outra mulher.
− Mas vocês sempre se deram tão bem!
− Faz uns dois meses... Não temos mais cumplicidade. Pouco conversamos, pouco saímos. Não lembro mais a última vez que transamos.
− Não consigo acreditar. E onde ele está agora? Nem vi vocês juntos desde que chegaram.
− Boa pergunta. Meu companheiro ­– ou ex ­– desapareceu.
− Calma, Adele. Não se precipite. Ele pode estar com algum problema no escritório e não quer preocupar você.
− Duvido. Ele teria me dito. É outra coisa. Tem mulher no meio.
− Vamos voltar para a festa. Tire do seu rosto esta tensão toda. Disfarce e faça de conta que está tudo sob controle.
− Se fosse fácil assim…
− Vamos procura-lo, está bem? Talvez ele esteja procurando por você justo neste momento.

Ambas as mulheres voltaram para a festa. Adele conseguiu por no seu rosto o belo sorriso que ficou congelado como uma máscara. Luciano não estava em parte alguma. Entredentes ela comentou com a prima:
− Acho que ele foi embora da festa.
− Por aqui – disse Zuleica com os olhos atentos – Talvez ele esteja na cobertura tomando um ar. Vamos até lá.

O coração de Adele pulava dentro do peito. Aquilo já era demais. Nunca Luciano a abandonara em lugar nenhum. Ele estava passando dos limites.
− Não falei? – Zuleica estava radiante. As duas primas pararam na entrada da cobertura. Algumas pessoas estavam lá fora, conversando e apreciando a incrível vista da cidade. Luciano também. De costas. No celular.
− Com quem será que ele está falando? – Adele sentiu um aperto no coração.
− Com algum amigo – garantiu Zuleica – Vá lá, não fique parada aqui imaginando coisas.

Respirando fundo e levemente estonteada pelo champanhe, Adele foi ao encontro de Luciano. Ele não a viu. Nem suspeitava que sua companheira estivesse se aproximando. O papo dele se desenrolava aos monossílabos, Adele mal entendia o que Luciano conversava. Mas pelo tom de voz, logo percebeu que não era sobre trabalho.
− Luciano…

A voz dela não passou de um sussurro. Apesar disso Luciano voltou-se rapidamente. Ele não teve tempo de disfarçar o susto.
− Está certo. Falo com você amanhã – Luciano desligou o celular, guardando-o no bolso.
O casal ficou se encarando por alguns segundos. Constrangida Adele perguntou:
− Atrapalhei você?
− Claro que não – e ele sorriu sem graça – Era o Antônio. Estávamos conversando sobre um processo cabeludo que eu peguei. Até foi bom você ter chegado. Não estava com o mínimo saco para conversar sobre trabalho agora. Vamos descer para a festa?

Dali para frente a tensão diminuiu. Luciano passou a se comportar esplendidamente, como antigamente. Atencioso, permaneceu ao lado de Adele, participou das rodinhas dos amigos dela e estava simplesmente encantador. Em certo momento, Zuleica a puxou para o lado e segredou:
− Eu não disse?

Adele sorriu aliviada. Certamente que era um problema no escritório. Coitado, não o deixavam relaxar nem depois do expediente.

... continua ...

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