quinta-feira, 18 de setembro de 2014

MENINAS MÁS (parte 3)

Voltei para casa sozinha naquele dia. O sinal tocou, eu peguei minha mochila e caí fora. Alguma coisa me dizia que Gabi seria cercada novamente por aquelas duas e eu não estava com estômago para ver aquilo outra vez. Meu almoço era sempre solitário. Eu sou filha única e meus pais só voltam à noite. Nunca gostei de fazer minhas refeições sozinha, mas naquela situação em que eu me encontrava não me importei. Esquentei a comida que minha mãe havia me deixado e comi chorando. Era a primeira vez durante aqueles anos todos que minha única amiga havia se afastado de mim.

Eu estava completamente sem chão. E me odiei por isto.

*

Decidi que deveria lutar pela amizade de Gabi. Acordei no dia seguinte disposta a isto. Por isto não alterei minha rotina. De manhã passei no prédio de Gabriela e ela estava lá, como sempre. Confesso que tive medo de encontrar Sarah e Vanusa também, mas felizmente isto não aconteceu. Gabi pareceu aliviada quando me viu e eu fiquei mais aliviada ainda por isto. Talvez nossa amizade não houvesse ficado abalada. Durante a ida não comentamos nada sobre os acontecimentos do dia anterior. Era melhor assim, zerar o assunto. Fiquei contente quando a própria Gabi me lembrou de que à tarde iríamos estudar matemática na minha casa depois do almoço. Isto também significava que eu não faria outra refeição solitária novamente. Ela parecia querer me agradar. E meu coração ficou feliz.

Quando chegamos na sala de aula, Sarah e Vanusa já estavam lá. Tentei ignorar o fato que as três se abanaram sorridentes e histéricas. Mas não consegui e me mordi de ciúmes. Gabi sentou ao meu lado e murmurou:

− Elas são super legais.

Nem respondi. Por mim eu queria mais é que elas se explodissem e não sobrasse pedaço nem para os cachorros comerem. Durante a aula, no entanto, percebi que Gabi estava inquieta e pouco concentrada. E eu sabia bem o motivo. Por causa disto, também perdi o foco, pois não conseguia deixar de reparar nos movimentos dela, não querendo perder nada. Muito frequentemente Gabi voltava os olhos na direção de Sarah e Vanusa. Acho que as vacas deveriam ter algum tipo de imã.

O melhor aconteceu na hora do intervalo. O sinal tocou e Gabi deu um salto. Levei um enorme susto, pois ela quase derrubou a cadeira. Logo entendi o motivo. Gabriela queria ficar com as duas. Antes que eu pudesse digerir aquilo, Sarah e Vanusa passaram reto por Gabi e saíram rindo em direção ao corredor. A trouxa ficou parada, em pé, com uma enorme cara de bunda. Apesar da minha raiva, tive vontade de rir também. Ver Gabriela sendo esnobada por seus dois novos ídolos era bom demais.

Não sei onde aquelas duas ficaram durante o intervalo, mas eu e Gabi nos sentamos em um banco mais afastado e só eu falei. Levou um tempo até eu perceber que ela não escutava nada do que eu dizia. Devia estar arrasada por ter sido ignorada tão sumariamente. Bem feito.

Quando voltávamos para a sala de aula, Gabi resolveu sair da sua depressão e me perguntou meio que rindo:

− E então? Sua mãe preparou alguma coisa bem gostosa para mim?
− Você nem sabe... Ela fez aquela macarronada com molho ao sugo e de sobremesa... Mousse de chocolate!
− Puxa! – sorriu ela colocando a mão no estômago. – Até já senti minha barriga roncar!

Descontraímos finalmente e voltamos para a sala de aula rindo. Gabi resolveu bancar a digna e não olhou em nenhum momento para o lado das duas. E eu senti que pelo menos naquele momento a parada estava ganha.

Minha alegria, porém, durou pouco. O professor nos liberou cinco minutos mais cedo e eu peguei Gabi pelo braço. Talvez fosse algum pressentimento, sei lá. Disse, tentando apressá-la:

− Vamos de uma vez, Gabriela. Estou morrendo de fome.

Ela não disse nada. Nem sequer olhou para “aquele” lado. Pegou a mochila, ajeitou a blusa amarrotada e veio junto comigo. Eu não larguei o braço de Gabi. Praticamente a arrastei pelo corredor até o portão. Ela nem se importou. Achou engraçado e comentou:

− Ei, você não se alimenta há quanto tempo?
− Se você soubesse como aquela mousse de chocolate está perfeita você entenderia o motivo da minha pressa.
− Ai, ai... Eu adoro a mousse da sua mãe! – exclamou ela saltitando em plena calçada na frente da escola. – Não vejo a hora de cair com tudo em cima e…
− Ei, Gabriela!

Gelei. Eu sabia de quem era aquela voz.


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