segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

UM CADÁVER NO MEU JARDIM (Cap. 2)

Os muros altos que cercavam a casa foram aliados dos dois irmãos. Enrolada em um grosso cobertor, Tereza foi arrastada da sala até o jardim. Ao lado da piscina, o corpo aos seus pés, Cris disse:

− Será que esta idiota não percebeu que a gente estava só brincando?
− Bom, isto não importa agora – André consultou o relógio e disse. – São quase uma hora da tarde. Nossos pais vão chegar perto das oito horas da noite. Até lá vamos ter bastante tempo para cavar um buraco e enterrar nossa amiga.
− O que você está dizendo? Entendi bem? Você quer enterrar a Tereza no nosso jardim?
− E você tem alguma ideia do que fazer com o corpo?
− Pensei em pôr no porta-malas e atirar em algum rio.
− E sermos flagrados por alguém? Não, cara. Vamos enterrar a Tereza por aqui mesmo. É mais seguro.
− Você acha seguro ter um corpo no seu jardim? Onde sua mãe e sua irmã tomam banho de sol? Onde seu pai costuma reunir os amigos para uma churrascada?
− Quer chamar a polícia? Quem empurrou ela foi você.
− Eu não empurrei ninguém. Nem toquei nela.
− Muito menos eu. Chamamos a polícia?
− Está bem – concordou Cris sem muita convicção. – Sem testemunhas então.

André pegou uma pá de bom tamanho na garagem e escolheu um ponto no jardim, próximo a um arbusto.

− O que você acha? O jardineiro tirou a grama para fazer uma floreira para a mamãe. A terra já está remexida mesmo e ninguém vai notar. E além do mais, quem não gostaria de repousar eternamente sob flores bem cuidadas?
− Se foi para fazer algum tipo de graça, desculpe. Não achei nada divertido.
− Cara, quer relaxar? – pediu André, mostrando-se muito calmo com a situação. – Nós não temos culpa. Ninguém mandou a Terê se meter na nossa brincadeira. Foi um acidente. No meio do caminho ela encontrou a quina de uma mesa e deu azar.
− Puxa, eu que não queria ser tão azarado assim… − murmurou Cris vendo o irmão pegar a pá e começar a cavar.

*

Os dois se alternaram escavando o buraco durante algum tempo. Quando consideraram a profundidade suficiente, André se espreguiçou, jogou a pá para o lado e perguntou:

− Quer fazer algum tipo de prece?
− Como assim, prece? Que prece você quer que eu faça?
− Sei lá, não tem padre aqui. Algo como encomendar o corpo.
− Encomende você. Não entendo nada destas coisas. E foi você quem inventou esta história de enterrar o corpo no jardim da nossa mãe.
− Melhor que a sua ideia de atirar a coitada no rio. Bem – e André juntou as mãos frente ao peito e fechou os olhos, – Tereza, siga em paz. De verdade, eu e meu irmão não queríamos matar você. Foi uma fatalidade. Adoramos todos os momentos que passamos juntos. Sentiremos saudade dos cachorros quentes com molho picante que você fazia para nós dois.

Cris não acreditou que estava ouvindo aquilo tudo. André fez o sinal da cruz, abriu novamente os olhos e encarou o irmão.

− Me ajuda a botar o corpo dentro da cova.

Com alguma dificuldade, os meninos empurraram a pobre Tereza para o buraco. Rapidinho, André cobriu o corpo com a terra e depois sapateou em cima para deixá-la lisinha. E disse aparentemente muito satisfeito com o seu trabalho:

− Pronto. Trabalho limpo e sem testemunhas.
− Tem uma testemunha sim – retrucou Cris inconformado com aquela situação.
− Quem? – indagou André surpreso.
− O Poncho.


O pastor alemão de estimação da família observava a cena a alguns metros de distância. 

Poncho sabia demais.

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