Renata acordou de madrugada em
meio a um sonho perturbador. Ao seu lado, o marido Claudio dormia
tranquilamente, sem imaginar o tamanho das emoções que assaltavam a sua esposa.
Fazia apenas um mês que a filha mais velha, Carol, havia morrido de leucemia.
No sonho Carol estava viva e
feliz. E andava de balanço no jardim. Da janela, Renata observava a filha de
cinco anos no brinquedo, balançando-se de um lado para o outro, rindo. A
gargalhada era possível de ouvir da janela do primeiro andar. De repente a garotinha
a encarou lá de baixo e sua risada se transformou em um sorriso de sangue, um
esgar aterrador. Foi neste momento que Renata despertou apavorada, vendo-se
sentada na cama, olhando para os lados procurando a filha morta.
Sim, ela sabia que era loucura,
mas mesmo assim se levantou, jogando as cobertas para o lado. Saiu do quarto de
mansinho para não acordar o marido e se dirigiu até a janela do escritório,
tensa e com o coração acelerado. Precisava confirmar que havia sido somente um
sonho. Mais um entre tantos.
Renata afastou as cortinas
violentamente e abriu a vidraça. Lá fora o balanço de Carol ía de um lado para
o outro, suavemente. Não havia vento nenhum naquela hora.
− O balanço da Carol estava se
movendo ontem à noite.
Era hora do café e Claudio lia o
jornal à mesa atentamente. Renata se perguntava como o marido conseguia levar
uma vida aparentemente normal tendo enterrado a sua primogênita há tão pouco
tempo.
− Devia estar ventando.
− Não tinha vento nenhum.
Claudio largou o jornal em cima
da mesa. Renata dava papinha para Maria, a filha bebê. Definitivamente, a
esposa não estava se recuperando bem da perda da filha. E o pior de tudo é que
parecia não fazer questão de superar a morte da Carol.
− Você sonhou.
− Sim, eu tive um sonho horrível
com Carol e o balanço. E quando me levantei para conferir, o brinquedo estava
lá, indo de um lado para o outro.
− Renata, você está sugerindo o
quê?
− Estou afirmando que nossa filha
está por aqui.
− E eu sugiro que você procure um
psicólogo.
Renata torceu o nariz. Não
precisava de tratamento. Só precisava de Carol. Claudio insistiu:
− Hoje em dias os medicamentos
estão cada vez mais modernos. E você se sentirá muito melhor. Por que você não
volta ao trabalho? Retome seus projetos de arquitetura.
− Preciso me dedicar a minha
filha que sobrou.
− Maria está muito bem – replicou
Claudio, apontando para a filha que batia palmas e ria com a boca desdentada. –
Você não.
A mulher ficou em silêncio. Não
demorou muito Claudio se fechou no escritório, deixando Renata tentando se
ocupar com os afazeres da casa. Mas a visão daquele balanço se movendo não saía
da sua cabeça. Aproveitando que Claudio estava totalmente imerso no seu
trabalho, ela deixou o bebê no tapete macio da sala e foi até o jardim.
A manhã estava fria e Renata
apertou o casaco ao redor do corpo. O balanço rosa estava lá, imóvel, como se a
aguardasse. Com passos incertos, ela se aproximou do brinquedo, hesitante. Um
aroma a envolveu. Era o perfume de morango que Carol usava.
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