domingo, 16 de março de 2014

O BALANÇO COR-DE-ROSA (parte 1)

Renata acordou de madrugada em meio a um sonho perturbador. Ao seu lado, o marido Claudio dormia tranquilamente, sem imaginar o tamanho das emoções que assaltavam a sua esposa. Fazia apenas um mês que a filha mais velha, Carol, havia morrido de leucemia.

No sonho Carol estava viva e feliz. E andava de balanço no jardim. Da janela, Renata observava a filha de cinco anos no brinquedo, balançando-se de um lado para o outro, rindo. A gargalhada era possível de ouvir da janela do primeiro andar. De repente a garotinha a encarou lá de baixo e sua risada se transformou em um sorriso de sangue, um esgar aterrador. Foi neste momento que Renata despertou apavorada, vendo-se sentada na cama, olhando para os lados procurando a filha morta.

Sim, ela sabia que era loucura, mas mesmo assim se levantou, jogando as cobertas para o lado. Saiu do quarto de mansinho para não acordar o marido e se dirigiu até a janela do escritório, tensa e com o coração acelerado. Precisava confirmar que havia sido somente um sonho. Mais um entre tantos.

Renata afastou as cortinas violentamente e abriu a vidraça. Lá fora o balanço de Carol ía de um lado para o outro, suavemente. Não havia vento nenhum naquela hora.

− O balanço da Carol estava se movendo ontem à noite.

Era hora do café e Claudio lia o jornal à mesa atentamente. Renata se perguntava como o marido conseguia levar uma vida aparentemente normal tendo enterrado a sua primogênita há tão pouco tempo.

− Devia estar ventando.
− Não tinha vento nenhum.

Claudio largou o jornal em cima da mesa. Renata dava papinha para Maria, a filha bebê. Definitivamente, a esposa não estava se recuperando bem da perda da filha. E o pior de tudo é que parecia não fazer questão de superar a morte da Carol.

− Você sonhou.
− Sim, eu tive um sonho horrível com Carol e o balanço. E quando me levantei para conferir, o brinquedo estava lá, indo de um lado para o outro.
− Renata, você está sugerindo o quê?
− Estou afirmando que nossa filha está por aqui.
− E eu sugiro que você procure um psicólogo.

Renata torceu o nariz. Não precisava de tratamento. Só precisava de Carol. Claudio insistiu:

− Hoje em dias os medicamentos estão cada vez mais modernos. E você se sentirá muito melhor. Por que você não volta ao trabalho? Retome seus projetos de arquitetura.
− Preciso me dedicar a minha filha que sobrou.
− Maria está muito bem – replicou Claudio, apontando para a filha que batia palmas e ria com a boca desdentada. – Você não.

A mulher ficou em silêncio. Não demorou muito Claudio se fechou no escritório, deixando Renata tentando se ocupar com os afazeres da casa. Mas a visão daquele balanço se movendo não saía da sua cabeça. Aproveitando que Claudio estava totalmente imerso no seu trabalho, ela deixou o bebê no tapete macio da sala e foi até o jardim.

A manhã estava fria e Renata apertou o casaco ao redor do corpo. O balanço rosa estava lá, imóvel, como se a aguardasse. Com passos incertos, ela se aproximou do brinquedo, hesitante. Um aroma a envolveu. Era o perfume de morango que Carol usava.


... continua ...

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