terça-feira, 26 de dezembro de 2017

O ÚLTIMO ACORDE

                Bom dia, leitorinhos! Este é o primeiro capítulo de uma história que pode, um dia, se transformar em um romance. Espero que curtam! Estejam todos convidados a darem sua opinião. Vou adorar!




Não havia ninguém no salão do hotel quando Elisa chegou. O lugar era sofisticado, mas aconchegante e ela se sentiu um pouco melhor. De olhos fechados, respirou fundo. Em meio a sua dor, estar isolada do restante do mundo trazia um pouco de paz ao seu coração tão devastado.
                Elisa abriu os olhos outra vez. No fundo do salão, de tons azuis, havia um piano de cauda. Na noite anterior, por conta da festa de casamento de Guilherme, ela escutara os doces acordes do piano que flutuaram em ondas até seus ouvidos. Mesmo trancada no quarto, Elisa pôde ouvir os sons das vozes animadas e felizes, os risos, a música e, por fim, o som inconfundível do piano. O dia mais feliz da vida de algumas pessoas tinha sido o pior dia da vida de Elisa.
                Com passos um tanto incertos, Elisa encaminhou-se até o piano. Já o tocara algumas vezes, inclusive para Guilherme, em noites mágicas passadas. Agora, que nada mais restava, Elisa decidiu tocar a última música. E depois, então, partiria para sempre.
                Ela sentou no banquinho e respirou fundo de novo. A música que escolheu era de sua própria autoria. Tinha composto em uma noite de verão, no tempo em que Guilherme lhe jurara amor eterno. Ainda que tivesse tocado a mesma música várias vezes para ele, Guilherme nunca se interessara em perguntar quem era o autor da composição. Talvez o amor dele por Elisa já estivesse fraquejando e ele não fizesse questão de saber. Ou pior ainda: era provável que nem tivesse escutado nada, a mente já voltada para seus outros interesses.
                “Como fui boba”, murmurou Elisa para si mesma quando iniciou os primeiros acordes. “Ele nunca me amou de verdade. Eu, a filha da camareira.”. A música logo envolveu o ambiente com sua doçura e força. Elisa se isolou do mundo como desejava e de olhos fechados e lágrimas escorrendo pelo rosto, a jovem deixou-se levar pela música, ansiando esquecer um pouco da dor e da sua própria vida.
                Após algum tempo – Elisa não saberia dizer quanto – um movimento no ar desviou sua atenção. A jovem olhou rapidamente para o lado e percebeu um vulto nas sombras. Imediatamente ela parou de tocar e ficou em pé, num salto. Não imaginava que alguém estaria lhe observando, logo em um momento que considerava tão privado.
                Elisa fez menção de fugir, mas o vestido comprido e esvoaçante prendeu no pé do banquinho.
                — Por favor, moça – a voz de um homem surgiu no meio da penumbra do salão – Fique. Não quis lhe assustar.
                Mas, além de assustada, Elisa também se sentia envergonhada. As lágrimas banhavam seu rosto e ela sabia que sua expressão era marcada pela dor. Mal podia ver o rosto dele.
                O homem aproximou-se um pouco mais, com a palma da mão estendida, como se quisesse impedi-la de sair dali. Ele era alto, jovem e com os cabelos levemente compridos, alcançando os ombros. Elisa nunca o havia visto na vida e ela supôs que fosse algum hóspede do hotel.
                Ambos ficaram se encarando por alguns instantes, sem dizer nada. Elisa tentou conter o choro, mas um soluço escapou-lhe da garganta. Envergonhada, ela deu um passo para trás.
                — Parabéns – elogiou ele com um sorriso sincero no rosto moreno. — Peço desculpas por interromper seu concerto. Estava lindo.
                Por algum motivo o coração de Elisa bateu mais forte enquanto fitava os olhos muito negros dele. Quis dizer alguma coisa, porém a voz lhe faltou.
                Quem seria ele? Perguntou Elisa a si mesma, em uma mistura de sensações e emoções. Nunca o vira circulando pelo hotel. Talvez fosse um dos convidados do casamento, até mesmo um amigo de Guilherme.
                Elisa recuou um passo, enxugando as lágrimas com o dorso das mãos. Não podia ficar ali. Todo o encanto da música e do momento haviam se desvanecido pelo lindo rapaz que não parava de fitá-la.
                — Posso ajudar você? – perguntou ele, gentil. — Quer um copo d’água ou...

                Ela deu meia volta e saiu correndo, levantando o bonito vestido para não pisar na barra. Não olhou mais para trás. Quase sem poder enxergar devido às lágrimas, Elisa atravessou o salão e saiu pelo enorme janelão que dava para os belos jardins do hotel, perdendo-se em meio à noite estrelada.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A MULHER DE CABELOS VERMELHOS


Bom dia, leitorinhos! Este é o primeiro capítulo de uma história que pode, um dia, se transformar em um romance. Espero que curtam! Estejam todos convidados a darem sua opinião. Vou adorar!

Ele chegou à cidade ao entardecer. Parou o carro em uma rua sem movimento e de longe enxergou a igreja, a praça e algumas pessoas passando. Havia algumas lojas abertas e a vontade de comprar cigarros aumentou. Precisava fumar antes de seguir viagem.
Marcelo entrou em uma cafeteria bem arrumada onde a dona, uma mulher acima do peso e com lábios vermelhos, parecia o aguardar detrás do balcão. Teve a impressão que ela soltou os cabelos loiros pintados assim que ele empurrou a porta e entrou no lugar.
— Ora, ora... temos visita na cidade – anunciou ela com um sorriso amistoso. E convidativo.
— Boa tarde – cumprimentou Marcelo sem muita vontade de prolongar a conversa. — Preciso de cigarros.
A mulher sorriu. Colocou um maço de cigarros sobre o balcão.
— Não tenho muitas marcas disponíveis aqui, mas meus clientes preferem este.
Marcelo deu de ombros.
— Tudo bem. É o que eu procuro.
Depois de um tempo em silêncio, enquanto Marcelo procurava o dinheiro para pagar, ela perguntou, curiosa:
— Para onde você está indo? Sei que não é da minha conta, mas...
— Santo Antônio – respondeu ele catando algumas moedas no bolso das calças. Quando tornou a olhar para a mulher reparou que ela estava pálida. —  Santo Antônio – repetiu como se isso fosse ajudar a desmanchar a cara de espanto dela. — Algum problema?
Ela tossiu, nervosamente.
— Não, não. Está tudo bem.
Mas não estava. Marcelo percebeu que as mãos da dona da cafeteria tremiam quando ela mexeu nos cabelos mal disfarçando a tensão.
— Qual é seu nome?
— O meu? Nádia.
Marcelo se aproximou mais do balcão e ensaiou o sorriso que usava quando queria conquistar alguma mulher. — Por que não me conta o que a deixou tão preocupada?
Talvez pelo sorriso ou simplesmente pelo tom de voz rouco de Marcelo, Nádia soltou um pouco o ar. Deu uma risadinha sem graça. Estava sem jeito.
— Santo Antônio. Bem, este lugar é um pouco diferente, se é que você não sabe ainda.
Ele sabia. Contudo, precisava saber mais. Bem mais.
— Sei muito pouco sobre Santo Antônio. Você acha que serei bem recebido por lá?
Os olhos de ambos se encontraram e Nádia em seguida os baixou, olhando para suas próprias mãos pálidas.
— Talvez. Se você for um deles.







Marcelo sentiu o coração acelerar. Talvez estivesse no caminho certo. Finalmente.
— Um deles?
— Eles costumam aparecer à noite – a voz de Nádia tremeu. — Alguns aparecem ao entardecer. Como você.
— Quem são... “eles”?
— Espere aqui.
Nádia deu-lhe as costas e se dirigiu para os fundos da cafeteria. Voltou um minuto depois com uma réstia de alho.
— Tome – disse ela com a respiração entrecortada. — Você vai precisar.
Marcelo esticou a mão e segurou o alho. Foi então que percebeu que no teto do estabelecimento havia réstias penduradas por toda parte. Sinistro.
— Creio que isto – ele apontou para cima – não faça parte da decoração.
— Nenhum pouco – garantiu Nádia, a voz tensa. — Você não é nenhum deles – ela ficou nitidamente mais aliviada. —  Não se desgrude dela – e apontou para a réstia.
Marcelo levou a mão sobre a camisa e apertou o crucifixo de prata que trazia por debaixo.
— Obrigado, Nádia.
Ele se virou para ir embora, apertando firme a réstia de alho nas mãos. Talvez fosse interessante comprar mais algumas em um armazém que achara ter visto duas lojas acima. Antes de ir embora escutou a voz assustada de Nádia:

— O nome dela é Pandora e seus cabelos são vermelhos.