domingo, 17 de fevereiro de 2019

UMA CASA DE SWING







        O fato é que o casamento estava por um triz. Depois de duas gestações seguidas o sexo quase não existia entre eles. Roberto se sentia um excluído na própria casa. Para onde quer que fosse, Denise caminhava com duas crianças penduradas em si, uma grudada nas pernas dela e a outra no colo. Não foram poucas as vezes que ele dormira no sofá da sala porque a filha menor não queria ir para sua própria cama. Mas Roberto desconfiava que aquilo era só uma desculpa para Denise não transar. E, sinceramente, só ficar na punheta não era a meta de vida do Roberto.
        A ideia de trair Denise era frequente, mas aquilo não era algo que o agradava. Poxa, afinal Denise era sua companheira há mais de dez anos e segurara poucas e boas enquanto ele lutava para conquistar algo melhor. Não era justo pôr um par de chifres na cabeça dela. Denise era legal. O problema é que estava sempre cansada demais para trepar. Talvez fosse uma fase. Quando as crianças crescessem tudo ficaria melhor. Só  que faltava um bom tempo para os filhos ficarem grandinhos.
        Quando soube do drama de Roberto, o colega mais bacana da repartição, Tadeu veio com a solução. Foi durante o almoço, em plena segunda-feira pós final de semana exaustivo com os dois pequenos doentes. Roberto confessou o inferno que andava sua vida e Tadeu estalou os dedos bem na frente do rosto do colega.
        — Sei como posso resolver isto.
        Roberto não entendeu direito. Até pensou que o amigo fosse dono de uma agência de viagens. Sim, porque o que mais Roberto precisava naquele momento era uma passagem só de ida para Saturno.
        — De que jeito? – perguntou ele desanimado.
        Então, com um sorriso malicioso, Tadeu pegou o celular, acessou alguma coisa e estendeu o aparelho para Roberto.
        — O que é isto?
        Tadeu olhou para os lados e baixou o tom de voz.
        — Sou dono de uma casa de swing.
        Roberto arregalou os olhos. Como? Tadeu, bem casado, pai de duas filhas que estudavam em colégio de freiras, aparência séria e fala formal, se mostrava despido de toda sua seriedade naquele momento. Os olhos do homem eram puro sexo.
        — Olha o site.
        Meio desconfiado, Roberto pegou o celular e navegou pelo site. Na verdade, não havia muita coisa o que ver. Um ambiente escuro, pessoas com rosto desfocado se divertindo, fotos de quartos com camas maior que o padrão. Em tom ainda baixo, Tadeu comentou:
        — Estas camas comportam mais cinco pessoas de uma vez só.
        Roberto assobiou. Quando era solteiro até pensou em frequentar um lugar daqueles, mas nunca levara em frente sua vontade.
        — Há pequenas salas para um sexo mais rápido. É proibido celulares e máquinas fotográficas. E você pode ir lá com sua esposa e não participar de nada. Só como observador, sabe? Acho que para seu casamento seria muito bom.
        Roberto ficou pensativo e devolveu o celular para o amigo. Alguma coisa se acendera dentro dele. Uma casa de swing seria interessante. Denise estaria junto e caso eles resolvessem participar ativamente da coisa não seria uma traição. O único problema era fazer Denise topar um evento daqueles.
        — Não custa perguntar, amigo – Tadeu pareceu adivinhar os pensamentos de Roberto. — Pode ser que tudo o que a sua esposa precisa para dar uma revitalizada é um sexo bem intenso. Com outro cara.
        — Bem, eu...
        — Vai, fala com ela. Uma buceta diferente vai te fazer toda diferença.
        A partir daí o dia adquiriu outro sentido para Roberto. O trabalho até ficou mais leve com aquela perspectiva. Mesmo assim, não queria se empolgar. Denise sempre fora toda certinha e o convite para frequentar uma casa de swing poderia lhe causar um choque. Mas... não custava tentar, não é mesmo?
*
        As crianças foram dormir cedo – graças a Deus – e já passavam das nove horas da noite quando Roberto e Denise terminavam de lavar a louça do jantar. Denise estava com os cabelos presos e uma aparência cansada. Aquele era o momento. E tinha que ser direto, sem enrolação.
        — O Tadeu tem uma casa de swing.
        Denise continuou secando a louça.
        — Quem é o Tadeu?
        — Meu colega.
        — Ele tem o quê?
        — Uma casa de swing. Você topa?
        Ela voltou a cabeça lentamente para o marido.
        — Casa de swing? Aquele lugar onde todo mundo come todo mundo?
        — Mais ou menos. Você pode ir e não comer ninguém. Vamos? – insistiu ele.
        Denise ficou em silêncio por alguns segundos.
        — Vamos deixar as crianças com quem?
*
        Do lado de fora era uma casa como qualquer outra. Um jardinzinho básico, uma fachada cinzenta, iluminação normal. Havia dois seguranças discretos na entrada e Roberto e Denise entraram lá sem problema. Os pertences foram deixados em uma recepção. O casal entrou de mãos dadas em uma sala escura que mais parecia um lounge. Grupos de pessoas conversavam mais intimamente sentados em sofás confortáveis e macios. Não havia sexo ali, só a intenção. Denise apertou a mão do marido, um pouco tímida.
        — O que a gente vai fazer agora?
        Roberto não tinha a menor ideia. Ele avistou um sofá dourado vazio e apontou para lá.
        — Que tal nos sentarmos e... observar?
        Denise topou. Mal haviam se alojado, um garçom apareceu ao lado deles. Roberto pediu um refrigerante. Estava nervoso.
        — Eu quero um uísque.
        Ante o olhar de espanto do marido Denise respondeu:
        — Eu vim me divertir.
        Uau. Aquela não era a Denise que ele conhecia há tanto tempo. Antes mesmo do garçom voltar, um cara mais novo que o Roberto surgiu frente a eles. Denise olhou-o de cima a baixo e sorriu. Calça jeans rasgada, camisa um pouco mais justa e rosto quadrado. Sexy na visão de Denise. Ela bateu com a mão no assento ao seu lado e convidou:
        — Quer?
        — Claro – a voz dele era máscula. Todo ele era assim.
        Roberto se sentiu um pouco desconfortável. Não havia pensado que sua mulher se interessaria por um cara. Ele próprio se viu transando com mais de uma mulher e Denise por ali, observando. Puro machismo. Era sua esposa que estava ali flertando com um desconhecido. Bem na sua cara. Ela não parecia nem um pouco envergonhada agora.
        — É a primeira vez que você vem aqui? – ele perguntou. Depois olhou para Roberto. — É a primeira vez de vocês?
        Denise sorriu. O uísque chegou. Ela tomou um gole sem tirar os olhos dele.
        — Sim. Tudo é novidade aqui. Qual seu nome?
        — Sem nomes – ele sorriu.
        — Claro, sem nomes.
        Roberto olhou para os lados. Enciumado. Não tinha nenhuma mulher sobrando para ele manter uma conversação? Não, Denise não iria transar com aquele cara. Não seria típico dela. Do outro lado da grande sala, Roberto percebeu que uma mulher mais madura o encarava. Era bonita, atraente, bem vestida. Mais de 50 anos, provável. Nunca se pensara transando com uma mulher tão mais velha assim. Mas... bem, podia pensar.
        — Pode me chamar de Alex – disse o cara.
        — Ah, combina com você seu apelido.
        Os dois deram uma risadinha cúmplice. Roberto se mexeu no sofá, esquisito. O tal do Alex olhou para ele e perguntou:
        — Está gostando do ambiente?
        Roberto balançou a cabeça dizendo que sim, mas na verdade a situação era toda anormal. Sua esposa, a mulher cansada e que vivia só para as crianças, se transformou de repente em uma criatura sexy e cheia de olhares libidinosos para o garotão. A coisa ia bem entre eles. Ele consultou as horas. Mal haviam chegado. Não iria sair agora e interromper o lance da Denise. Porém, ele podia fazer isto, ora bolas. Eram casados e deviam ser fiéis um ao outro.
        — Oi...
        A mulher madura e de cabelos louros atravessara o salão e agora estava parada ao lado de Roberto. Usava um vestido azul brilhante e o corpo era bem interessante. Denise a olhou de alto a baixo com seu sorriso cheio de quintas intenções e que Roberto nem lembrava que ela ainda possuía.
        — Sente aí – ela disse. — Vimos aqui fazer novos amigos.
        Minha nossa. Roberto sentiu o perfume antes mesmo da mulher sentar ao seu lado, roçando a perna ligeiramente na sua.
        — Adoro conhecer gente nova – miou ela olhando direto para Roberto.
        Ele virou meio copo de refrigerante em meio às risadinhas de Denise e o gostosão. Não tinha assunto com a mulher, mesmo ela sendo bem envolvente.
        — Então... você tem nome ou não pode me dizer também?
        Puro nervosismo.
        — Me chame de Fada Azul – talvez fosse uma alusão ao vestido, pensou Roberto. Ela continuou. — Mas depois de uma certa hora pode me chamar de Foda Azul.
        Ele riu. Uau. Fada Azul não tinha papos na língua.
        — Você veio sozinha?
        — Que nada – ela tomou um gole de alguma coisa que havia dentro do seu copo. — Trouxe um amigo que está numa merda desgraçada no seu casamento. Ele se deu bem – Fada Azul esticou os olhos para Denise. — Ela está indo bem, não? Seu casamento estava naufragando, certo? Então vocês vieram aqui dar uma sacudida na relação. Acertei?
        — Você é muito perspicaz.
        Fada Azul se aproximou dele e cochichou:
        — Aqui é ótimo. Sempre me divirto bem. Como posso chamar você?
        — Que tal “tímido constrangido”?
        Ela riu jogando a cabeça para trás. Sexy.
        — Duvido que seja tanto assim.
        — Ô...
        Denise deu uma risadinha. O garotão de alcunha Alex havia acabado de dar um beijinho na orelha dela, bem naquele ponto em que ela se arrepiava e ficava molhadinha em questão de segundos. Engraçado que Roberto se achava dono daquela orelha. Pelo visto estava bem enganado.
        — Você é lindo.
        Fada Azul parecia estar com pressa. O vestido micro subira para o meio das coxas. Roberto nem sabia que dava para sentar com uma roupa daquelas. Fada Azul estava ali para comprovar o contrário.
        — Obrigado – Roberto passou a mão no rosto, envergonhado. Não tinha o que fazer com as mãos. — Eu esqueci de fazer a barba, sabe?
        — Mas eu gosto de ser arranhada.
        — Ah, isto é ótimo.
        Denise deu um cutucão no marido. Os olhos dela brilhavam. A quanto tempo ele não via sua esposa assim? Talvez no tempo de namorados e olhe lá.
        — Vamos para o quarto? O das camas que cabem um dez? Nós todos aqui.
        Roberto foi o último a concordar. Por que não? Por que não??? De onde tirou que só ele transaria e Denise ficaria olhando? Denise foi a primeira a ficar em pé, de mãos dadas com Alex. A Fada Azul pôs a mão na cintura de Roberto e todos foram para o quarto das camas gigantes. A noite só estava começando e Roberto não tinha a menor ideia de como iria terminar.
*
        Meio dia. Tadeu e Roberto frente a frente no mesmo restaurante de sempre.
        — E então? Como foi?
        Roberto levou um tempo para responder.
        — Foi legal. Nós conhecemos pessoas diferentes, sabe. Interessantes. Decididas.
        Tadeu balançou a cabeça concordando.
        — Este é o objetivo. Você pode voltar a hora que quiser. De graça.
        — Obrigado.
Roberto lembrou da noite memorável que tivera com Fada Azul e da surpresa que tivera quando ela ficou nua. Deveria ter saído correndo quando descobriu que Fada Azul deveria ser a tia do Pabllo Vittar, mas... qual o problema de experimentar coisas novas? No fim deu tudo certo. Denise acordara bem-humorada e até as crianças pareciam estar mais calminhas. Ela não estranhou o fato de o marido ter transado com um travesti e Ricardo não perguntou se o pau do Alex era melhor que o seu. Continuavam felizes e juntos.
Pensando na próxima vez.