Um dia depois do enterro de Juarez, Lorena voltou para casa e Valentina, a sobrinha, ficou com Lourdes para lhe fazer companhia por um tempo, o tempo que precisasse. Sentada no banquinho da cozinha, magoada e traída, Lourdes observava Valen preparar, animada, bolinhos de arroz.
― Sabe o que eu vou fazer? –
Lourdes rugiu. ― Vou desinfetar esta cozinha. Foi aqui que o encosto morreu.
Valentina deu uma risada.
― Tia, relaxa. Ele tá morto
mesmo.
― Morreu de pau duro. Devia
estar pensando na outra.
― Bem, só o tempo para aliviar
sua mágoa. Mas pense positivo. Agora todo mundo sabe que o tio Juarez era
sem-vergonha. Eu, pessoalmente, achava ele um santo.
― Santo. Santo do pau oco,
aquele cretino.
Inquieta, Lourdes levantou e foi
até o quarto em que dormiu, feliz, por 15 anos com Juarez. De forma violenta,
abriu a porta do guarda-roupa e pôs para baixo todas as roupas do falecido.
Depois, pegou vários sacos de lixo e jogou dentro, obstinada. Valentina fritava
os bolinhos quando viu a tia passar arrastando vários daqueles sacos pretos em
direção ao quintal.
― Tia, que merda é esta? O que
você está fazendo?
― Vou tacar fogo nas roupas do
traidor.
― Por que você não doa para
alguma instituição de caridade? – a jovem desligou o fogo e foi atrás de Lourdes. ― Tem tanta gente precisando...
Mas Lourdes não queria saber de
mais nada. Sem olhar para a sobrinha, juntou alguns pedaços de madeira que
estavam no fundo do quintal e os reuniu no meio do pátio. Valentina percebeu um
olhar frio de psicopata vindo de Lourdes.
― Tia, a senhora está bem?
― Nunca estive tão bem na minha
vida.
A fogueira foi facilmente acesa.
As labaredas subiram rápidas e Valentina recuou.
― Cuidado para não se queimar, tia.
Lourdes não se deu ao trabalho
de responder, focada na missão de incendiar as roupas do Juarez. Peça por peça,
sentindo um grande prazer naquela atividade, Lourdes foi atirando as roupas com
vontade, algumas vezes soltando gargalhadas sinistras. Nem reparou que a
sobrinha registrava a cena com o celular, enviando fotos para que Lorena visse
a que ponto ela chegara.
Já no final, com as chamas bem
vivas, Lourdes jogou a última peça de roupa. Era uma cueca boxer vermelha. Uma
cueca que, inclusive, Lourdes adorava quando o marido tirava.
― Que cena incrível! – berrou
ela, extasiada com as chamas altas.
Então, o provável aconteceu. Um
vento começou a soprar do nada e uma fagulha pegou em uma roupa do varal de
Lourdes.
― Tia, a camisola tá
incendiando.
De repente, Lourdes pareceu cair
na real. A camisola que tanto amava pegava fogo. Valentina correu para pegar um
balde e encher de água.
― Valen, as outras roupas estão
pegando fogo também!
Valentina olhou para trás e se
desesperou ao ver a cena. A tia, apavorada, tentava salvar as outras peças do
varal que começava a incendiar.
― Fogo! Fogo! – Valentina tentou
gritar, mas o pânico era tanto que a voz saiu fraca.
― Valentina, chame os bombeiros!
Antes, contudo, que Valentina
conseguisse se mexer, um homem de mais ou menos 50 anos apareceu do outro lado
da cerca. Como um super-herói, ele saltou para o quintal de Lourdes e em pouco
tempo conseguiu debelar o fogo, tanto da fogueira com as roupas já queimadas do
Juarez, quanto do varal. Angelina e outras vizinhas apareceram já dentro da
casa de Lourdes depois de terem arrombado a porta, imaginando que tia e
sobrinha estivessem presas. A situação estava sob controle.
E Lourdes não conseguia afastar
os olhos do vizinho bonitão.
Quem era aquele cara?
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