Getúlio foi obrigado a rir ante os preparativos do
primo. Um pouco antes das oito horas da noite ele já estava pronto para sair.
Lavou o cabelo, pegou emprestado o perfume caro de Getúlio e até vestiu a calça
nova comprada na loja da Clotilde poucas horas antes. Ao contrário do dia
anterior, a noite estava agradável e estrelada. Perfeita para um encontro como
ele mesmo fizera questão de frisar.
— E se ela não estiver lá? ─ perguntou Getúlio, meio
que surpreso com o empenho de Josué em ir atrás da moça desconhecida.
— Se não estiver hoje, pode ser que amanhã ela
venha. Ou depois — Josué estava bastante empolgado. — Quero saber quem deixou
uma dama daquelas esperando sob chuva e frio. Aquilo não se faz.
— Bem, boa sorte.
— Obrigado ─ disse ele dando o retoque final no cabelo.
— Se eu demorar você saberá o motivo.
Josué saiu em seguida e tomou o rumo da praça. Seus
passos eram nervosos e apressados. Ainda não sabia bem o que dizer se ela
estivesse lá. Geralmente desinibido no trato com as mulheres, daquela vez Josué
se sentia tímido. Mesmo assim isto não foi o bastante para desanimá-lo. Seguiu
firme e forte, sentindo as mãos frias dentro do bolso. Seu empenho foi
recompensado. Assim que dobrou a esquina, deparou-se com a visão da jovem
sentada no mesmo banco, exatamente como a noite passada. Josué parou, respirou
fundo e tomou a direção dela. A ansiedade aumentou à medida que se aproximava.
Não havia ninguém na praça quando ele parou ao lado da moça.
A jovem olhava para algum ponto indefinido a sua
frente, as mãos cruzadas no colo sobre o vestido branco. Os cabelos louros
estavam cobertos por uma espécie de véu. Apesar do ventinho frio, aquilo não
parecia lhe afetar.
— Boa noite, moça.
Ela não respondeu imediatamente e Josué chegou a se
perguntar se seria surda. Aos poucos, porém, voltou seus olhos para cima e
fitou Josué. Assim, tão de perto, a moça era ainda mais linda.
— Boa noite ─ repetiu ele.
— Boa noite ─ ela disse com a voz quase sussurrada.
Estranho aquilo, disse Josué para si mesmo. Algo não
estava certo ali.
— Você… você está sozinha?
Ela voltou a olhar para frente e balançou a cabeça
fazendo que sim.
— Qual seu nome? O meu é Josué. Muito prazer.
Nada. Sem resposta, Josué se sentiu um bobo. Ele
tentou novamente:
— Qual seu nome?
Silêncio. Um vento mais geladinho começou a soprar e
o rapaz aconchegou-se no seu casaco. O vestido dela era fino, mas mesmo assim a
garota não dava sinais de que passava frio. Criatura estranha aquela!
— Por que você está sozinha? Desde ontem eu a vejo
aqui. Está esperando alguém?
A moça o olhou mais demoradamente desta vez.
Murmurou depois de alguns segundos:
— Eu preciso ir para casa.
— Bem, eu posso levar você. Permite?
Ela não respondeu e se levantou, parando ao lado de
Josué.
— Você é daqui da cidade? Onde você mora?
A moça apontou para frente e Josué entendeu que
aquela era a direção para onde ambos deveriam se dirigir. Ao lado dela, o homem
acompanhou os seus passos suaves e silenciosos. A moça era tão graciosa que
parecia deslizar. Era uma lástima que não fosse de muita conversa.
— De onde você vem? ─ insistiu Josué, ansioso para
travar uma conversa.
Pelo visto a moça não estava nem um pouco disposta a
bater papo. Josué, desconcertado, iniciou um monólogo incessante. Não sabia
sequer se a moça estava ouvindo alguma coisa. Ela permanecia ao seu lado,
olhando para frente, parecendo alheia a todo o resto. O próprio Josué se sentia
um tolo.
A jovem tomou um rumo um pouco desconhecido para
Josué. Depois de um tempo, ambos pegaram um caminho que se afastava da parte
central da cidade. Um pouco temeroso, Josué olhou ao redor. Não estava gostando
muito daquele novo trajeto.
— Você mora para estes lados?
Subitamente ela parou. A rua não era muito clara. Faltavam
postes de iluminação por ali. Sem falar nada, a moça apontou para um local
atrás de dele. Josué, a princípio, não entendeu. Havia dois portões de ferro
enferrujados e muitas árvores mais para o fundo. Não parecia ser um local de
moradia.
— Aqui? Você mora aqui?
Intrigado, Josué foi até os portões. Queria saber o
que havia atrás deles. Era tudo muito antigo. Como seria a casa da garota?
Velha, caindo aos pedaços, solitária como ela?
Os olhos do homem custaram um pouco a se acostumar
com a escuridão além dos portões. Era difícil conseguir visualizar alguma coisa
mesmo com a luz das estrelas.
— Meu Deus... ─ sussurrou quando distinguiu dois
túmulos velhos e carcomidos pelo tempo poucos passos de onde estava. Aquele
lugar era o cemitério da cidade!
Totalmente pálido e sem sentir as pernas, o rapaz se
voltou bruscamente para a moça. O sorriso fantasmagórico que ela lhe lançou fez
com que Josué soltasse um grito horrível, de puro medo.
— Quem você é? De onde você vem?!
A moça fez menção de se aproximar e estendeu sua mão
para tocá-lo. Tomado pelo pânico, Josué deu dois passos para trás, tropeçou em
uma pedra e se estatelou no chão, sem nunca tirar os olhos de cima dela. O
fantasma, a alma penada ou seja lá o que fosse aquela criatura, caminhou na
direção de Josué. Mais do que rápido ele ficou em pé e com as mãos feridas e
sangrando pela queda nas pedras do cemitério, ele deu meia volta e saiu
correndo e arfante daquele lugar tenebroso.
Adorando essa história, amo histórias assim. Beijos Patrícia
ResponderExcluirAdorando essa história, amo histórias assim. Beijos Patrícia
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