A hospedaria
ficava em uma curva na beira da estrada. Um jardim bem cuidado na frente
tornava o lugar aconchegante. Do lado de fora era possível sentir o aroma
delicioso da carne feita nas grandes panelas da cozinha da hospedaria. Eimé, a
dona do local, dava conta das deliciosas comidas preparadas junto com a
cozinheira, Maria, que a acompanhava há muito tempo. Kendra, a filha de 19
anos, ajudava a servir os visitantes e hóspedes.
O trabalho de
Kendra, assim como das duas outras mulheres, era pesado. Acordavam-se antes de
o sol raiar e imediatamente começavam os preparativos para o desjejum e, em
seguida, para o almoço. Entre um intervalo e outro, Kendra limpava a hospedaria
e os seis quartos que a compunham. Assim era o dia todo, as horas passavam rápidas
demais. Quando Kendra repousava a cabeça no travesseiro antes das oito horas da
noite, seu corpo já estava cansado demais para pensar em qualquer coisa. Ela só
queria dormir.
Aquele dia
quente de sol não foi diferente. Kendra levantou ainda de madrugada, como de
costume, pôs seu vestido simples de trabalho e prendeu os cabelos loiros e
cacheados debaixo de um lenço florido. Os olhos azuis brilhavam intensamente
quando desceu as escadas e logo começou a trabalhar.
Na cozinha as
panelas fumegavam, enquanto o aroma delicioso da comida dava água na boca dos
visitantes que lentamente começaram a chegar para o almoço. Kendra se
movimentava de um lado para o outro para dar conta de tudo e logo um fiozinho
de suor começou a escorrer pelas costas. Em meio às atividades frenéticas
lembrou que poderia ir à lagoa mais tarde, se sobrasse um tempo. Depois que
limpasse a cozinha não faria mal nenhum se desse uma escapulida, desde que Eimé
não visse. A mãe sempre tirava um cochilo depois que os afazeres do almoço
terminavam.
Kendra servia
uma travessa de carne e especiarias a um visitante, alheia ao burburinho de
vozes masculinas a sua volta. Sabia ser o alvo de muitos olhares, mas nenhum
daqueles homens a interessava. Pesados, barbudos e fedidos, isto o que eles
eram. Já tinha 19 anos e nenhuma perspectiva de encontrar um amor. Não por
aquelas bandas, pelo menos.
O ruído de vozes
subitamente cessou. A princípio, Kendra não se deu conta. Continuou servindo a
comida como se nada estivesse acontecendo. Sem querer, seus olhos se voltaram
para Eimé. A mãe segurava um pano de prato, olhando fixamente em direção à
porta. Ela estava diferente, parecia surpresa com alguém que recém chegara.
Curiosa, Kendra resolveu fazer o mesmo e conferir quem era.
Um homem alto,
pele morena e cabelos escuros estava parado à porta, perscrutando o salão
procurando um lugar para se acomodar, juntamente com seu cocheiro. Eimé,
recuperando-se do seu torpor, adiantou-se para receber o ilustre freguês.
O coração de
Kendra acelerou, a ponto de ela fazer transbordar vinho da taça de um hóspede,
precisando secar tudo em seguida, embaraçada. Com o canto dos olhos, percebeu o
belo homem já acomodado em uma mesa mais ao canto. Eimé se aproximou da filha e
a puxou para a cozinha. A mãe estava visivelmente encantada.
— Temos um
hóspede célebre hoje. Sirva o conde direitinho e se mantenha calada.
Eimé colocou uma
travessa de carne nas mãos da filha.
— Leve de uma
vez. Ele e o cocheiro estão com fome.
Kendra pegou o
recipiente quente e se dirigiu até a mesa. Os olhos do conde se cruzaram com os
dela e Kendra se sentiu envergonhada. Pelo que se lembrava, era a primeira vez
que um homem daquele porte aparecia na hospedaria, o que justificava o
comportamento da mãe. E dela própria. Tensa, Kendra colocou a travessa sobre a
mesa e relanceou os olhos rapidamente para o conde.
— Traga-nos
vinho ─ disse ele encarando Kendra sem disfarçar um certo interesse.
A moça chegou a
estremecer. A voz dele era forte. Forte e fria. O tom arrogante aumentou um
pouco o calor que sentia percorrer seu corpo. Tímida, Kendra respondeu, quase
sem olhar para o rosto dele:
— Sim, senhor.
— Agora.
— Sim, senhor.
Quase sem ar,
Kendra deu meia volta e foi até a cozinha buscar a jarra de vinho. Eimé estava
à frente das panelas e percebeu que a filha parecia um pouco estranha.
— Tudo bem no
salão?
Kendra não
encarou a mãe. Sabia a que ela se referia. Segurando a garrafa e os cálices, a
jovem respondeu:
— Ele quer
vinho.
— Leve de uma
vez. Não deixe o conde esperando ─ ordenou Eimé rispidamente, secando o suor
com um lenço.
Kendra retornou
ao salão. O lugar estava cheio, havia vozes por todos os lados. Porém, ela não
via mais ninguém. A beleza e virilidade do conde tomavam conta do ambiente. As
pernas estavam trêmulas quando Kendra parou frente à mesa. Serviu os cálices
tentando não tremer demais, ciente do quanto era observada por ele. De repente,
sentiu um leve empurrão. Era Eimé. Sorridente e não parecendo sentir um pingo
de vergonha ante aquela visita ilustre, ela disse para a filha, sem tirar os
olhos do homem:
— Volte para a
cozinha. Maria precisa de você lá.
Era a primeira
vez que Eimé se dirigia a ela daquele jeito, pedante e seco. Sentindo-se
magoada, Kendra foi até a cozinha. Maria cortava um pedaço de pão e as panelas
cozinhavam carne.
— Mamãe disse
que você precisa de ajuda.
Maria a olhou
sem entender.
— Aqui está tudo
sob controle, Kendra ─ ela olhou pelas frestas da janela. — Veja, chegou mais
uma carruagem! Ajude a arrumar uma mesa para o próximo visitante.
Kendra voltou
para o salão e ajudou a servir as demais pessoas. Eimé circulava pelo lugar com
uma postura diferente, os ombros para trás e com os longos cabelos castanhos
descendo pelas costas. Nunca Eimé tirava o lenço da cabeça, mas por causa do
homem ela abrira uma exceção. Kendra se sentiu enciumada. Era nítido que ela
queria chamar a atenção do homem bonito. Pelo visto, no entanto, as tentativas
de Eimé resultavam frustradas. O conde não tirava os olhos de Kendra.
Cada vez mais o
desejo tomava conta de Kendra. Se no início estava tímida, depois de um tempo
já não se sentia tão envergonhada em sustentar os olhares calorosos que o conde
lhe enderaçava. Em dado momento, chegou a esboçar um sorriso leve, para depois
quase se arrepender. Nossa, não queria que o desconhecido a achasse uma
oferecida. De qualquer forma, era muito bom sentir-se desejada. Ah, seria
maravilhoso que ele passasse apenas uma noite que fosse na hospedaria!
A mão calejada
de Eimé a segurou fortemente pelo cotovelo. Kendra deu um gemido baixinho ao
mesmo tempo em que enfrentava os olhos furiosos da mãe.
— Venha comigo
já.
Kendra não teve
coragem de olhar para os lados, mas teve certeza que muita gente viu sua
vergonha ao ser conduzida como uma criança para a cozinha. Lá dentro, Eimé,
furiosa, quase bateu na filha única com um pano de prato sujo.
— Não saia desta
cozinha, entendeu? Pensa que não vi seu olho comprido para cima do conde? Não se
comporte como uma rameira.
A moça não disse
nada. Era lógico que Eimé estava morrendo de ciúmes. E era óbvio também que o
conde não teria interesse nenhum pela mãe, jovem, porém com o corpo disforme.
Inconformada, Kendra se sentou em um banco da cozinha. Maria foi levada ao
salão para ajudar a servir os visitantes.
O calor na
cozinha era insuportável e a raiva de Kendra também. Sem se importar com o
trabalho ou com o castigo que levaria da mãe mais tarde, a jovem abandonou a
cozinha e suas panelas, fugindo pela parte de trás da hospedaria. Caminhou
lentamente até a lagoa, aproveitando os odores do bosque e o ar puro. Precisava
de um mergulho para afastar o calor que a consumia. Sabia que quando voltasse,
o conde estaria longe. Mas seria melhor assim. Nunca mais o veria mesmo.
Kendra tirou o
vestido lentamente e agachou-se à beira da lagoa para sentir a temperatura da
água. Estava perfeita. Animada, Kendra entrou com cuidado e mergulhou em
seguida, adorando aquele momento. Precisava de um descanso. Fazia alguns dias
que não tinha tempo para si mesma.
Ela perdeu a
conta do tempo em que ficou por ali, esquecida dos seus afazeres. Talvez sua
mãe não precisasse tanto dela, já que a despachara da hospedaria daquela forma
tão rude. Kendra decidiu permanecer mais um pouco na lagoa, imaginando se o
homem bonito já teria partido. Esperava, com todas as suas forças, que ele
voltasse um dia.
Um ruído de
passos sobre alguns galhos partidos afastaram Kendra dos seus devaneios. Ela se
assustou. Não estava sozinha! Nervosa, chegou a afundar, engolindo água. Quando
voltou desajeitada à superfície, deparou-se com o homem a observando da beira
da lagoa.
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E a parte 2?
ResponderExcluirE a parte 2?
ResponderExcluirBrunna, eu vou postar hoje à noite a 2ª e última parte. Obrigada!
ExcluirDevemos ter cuidado com a pontuação correta!
ResponderExcluirEla também dá dinamismo à Narrativa,motivando a leitura!
Obrigada pela dica!
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