Ela abriu a porta e pensou ter
escutado um barulho no andar de cima. Passos. Sim, era como se fossem passos. Nada
que a surpreendesse.
Não eram ladrões que haviam
invadido o lugar. A casa era assombrada. Descobrira isto depois que os avós que
lhe criaram morreram misteriosamente com um intervalo de apenas dois meses um
do outro. Desde então passos, portas batendo e sussurros foram seus companheiros.
Os únicos naquela vida solitária que levava. Mesmo depois de passados cinco
anos da morte das únicas pessoas que amou na vida, os fantasmas lhe
acompanhavam.
Mas não gostava daquelas
companhias. Elas lhe aterrorizavam, como agora quando subia as escadas que
rangia a cada passo. Lá fora raios e trovões iluminavam a noite escura. Tentara
inúmeras vezes se livrar da casa, mas a maioria dos compradores sequer
atravessava a porta. Pareciam pressentir que algo maligno habitava por lá e
batiam em retirada com uma desculpa qualquer.
Quando chegou ao andar de cima o
corredor se estendeu escuro a sua frente. Os passos ecoaram mais fortes e ela
acendeu a luz. Já sabia quem era. E brilho nenhum o afastaria.
A luz forte brilhou por todo o ambiente e ela
se sentiu encorajada para prosseguir. Na verdade gostaria de se enfiar no
quarto, trancar-se lá dentro, protegida com seus altares e santos. Lá dentro suas
companhias indesejáveis não entravam. Nem ele. Mas quanto tentou levar suas
crenças para outras partes da casa, um vento forte e misterioso derrubou tudo e
as velas acesas quase prenderam fogo por todo o lugar. Pena que não incendiou,
pensou mais tarde.
Ela caminhou quase sem sentir as
pernas até o final do corredor e o som cessou. Mas ela sabia que alguém estava
ali. Seu fantasma, como o chamava. Havia o visto algumas vezes com o canto do
olho. Era alto, magro, moreno. Vestia-se com roupas antigas e possuía um rosto
perfeito. Volta e meia ela o percebia atrás de si na hora do jantar ou até
mesmo no jardim. Quando então se virava para flagrá-lo, o fantasma não estava
mais ali.
Agora ele outra vez. Os outros não
passavam de um vento ou uma sombra. Não era estes que temia. Tudo se fez
silêncio. O único som que escutava era o da sua própria respiração. Ela
caminhou lentamente até o fim do corredor. No fundo havia a porta da
biblioteca. O espectro gostava de ficar lá. Quem sabe em vida tivesse passado bons
momentos ali, junto com a mulher que amara. Talvez a mulher tivesse sido ela
mesma. Ou ele teria morrido de uma forma horrível e agora se encontrava preso
na biblioteca, na casa, sem conseguir se desprender do mundo terreno?
Sem conseguir respirar direito,
ela abriu a porta de supetão. Ele estava lá, sentado na poltrona preferida do
seu avô. Nunca ficara frente a frente com o fantasma. Fugia assim que pousava os
olhos nele. Mas naquela noite ela resolveu fazer diferente. Precisava enfrentá-lo.
Talvez ele dissesse então porque a atormentava tanto.
− O que você quer de mim?
Uma brisa suave balançou os
cabelos dela. Os olhos do espectro brilharam.
− Você.
A voz dele fluiu naturalmente
como se fosse uma pessoa de verdade, de carne e osso. Ela mal acreditou. Não
havia sido uma boa ideia aquilo, pensou quando viu o fantasma se levantar e se
aproximar dela tão lentamente que parecia flutuar. Em questão de segundos
estavam frente a frente.
Ela fechou os olhos quando uma
sensação de frio e calor misturados invadiu seu corpo. Queria sair daquele
lugar antes que se perdesse, porém suas pernas não lhe obedeciam mais. Sentiu
algo áspero como uma língua passando pelos seus seios e inutilmente estendeu as
mãos para frente para afastar o fantasma de si. A língua desceu para a barriga
e logo em seguida para o meio das suas pernas. Ela gemeu. Angustiada, começou a
arrancar suas roupas freneticamente. Havia muito tempo que não era possuída por
homem nenhum. Seu corpo inteiro ardia de excitação. Entreabriu os olhos. Agora
estava deitada no chão, nua, as pernas escancaradas. O fantasma estava sobre si
e ela o envolveu com seus braços. Acabou abraçando ela mesma. Ficou
decepcionada, queria um contato carnal. Mesmo assim, o prazer que o fantasma
lhe proporcionava era algo incalculável. Todas suas experiências sexuais anteriores
haviam sido ruins. Ela sempre acreditou que o orgasmo era uma invenção até que
foi sacudida por um.
Os raios e trovões não foram
suficientes para sufocar seus gritos de tesão. Algo lhe arremetia contra o
próprio corpo. Os olhos do espectro estavam muito próximos dela. Fazer amor com
um fantasma? Aquilo estaria mesmo acontecendo?
De repente ela despertou. Deitada
no chão frio da biblioteca escutou batidas fortes na porta da frente da casa.
Ainda sem acreditar na incrível experiência que havia passado, ela juntou suas
roupas, vestiu-se ainda zonza e desceu quase caindo as escadas. Sequer olhou
pela janela para ver quem estava lhe visitando naquela hora da noite.
− Nos avisaram sobre gritos nesta
casa e viemos saber se está tudo bem.
Era a polícia. Ela os olhou
envergonhada. Estava mal arrumada, descalça e descabelada. Com cara de quem
havia feito sexo selvagem por horas.
− Gritos aqui? Não… não é nada.
Talvez fosse a TV.
Os homens a encararam uma última
vez, desejaram boa noite e foram embora. Ela fechou a porta e voltou correndo
para a biblioteca. Queria continuar a sessão incrível de sexo nem que fosse a
última coisa que viesse a fazer na vida.
O fantasma não estava lá. E nem
nunca mais voltou.
Meses mais tarde ela foi
internada em um hospital psiquiátrico de onde nunca mais saiu.
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