sábado, 2 de agosto de 2014

MORRA!





Ele era meu chefe. Nem era tão bonito assim, mas eu era apaixonada por ele. Não sei o que me atraía. O poder. A voz grossa. O fato de ser mais velho. Na minha cegueira de paixão achava também que ele era louco por mim. De onde tirei esta maluquice não faço ideia. O fato é que ele me tratava bem, sempre gentil, elogiava meu trabalho. Mal reparava que o cara era assim com meus outros colegas.

Nos meus sonhos mais loucos nós nos casávamos e vivíamos um amor de sonhos. Para não cair no ridículo, eu sabia disfarçar muito bem meus sentimentos. Lá no escritório ninguém sabia o quanto eu adorava aquele homem.

Ele era tudo pra mim. Eu era capaz de fazer qualquer coisa por ele. Mesmo, de verdade.

Um dia voltei do almoço e encontrei a esposa dele lá. Foi um choque e eu tive que engolir a seco. A desgraçada era linda. Jovem, longos cabelos louros, olhos verdes. Nem parecia ser de verdade. Fui obrigada a cumprimentá-la como se a achasse o máximo. Aliás, o clima de puxa-saquismo no escritório em torno dela era total. Precisei me afastar um pouco para tentar digerir aquela novidade. Pensando bem, era óbvio que meu chefe não poderia ser solteiro. Um homem daqueles jamais estaria sozinho.

Fui para casa e chorei tudo o que podia agarrada no travesseiro. Eu tinha que pôr tudo para fora e assim poder enfrentar o dia seguinte. Enfrentar o vazio, pois nada mais seria o mesmo agora.

Contudo, no outro dia, acordei-me com uma fúria incontrolável. Enquanto tomava o café da manhã me peguei desejando a morte daquela mulher. Com requintes de crueldade. Eu simplesmente não conseguia aceitar que meu chefe amava outra pessoa e que todos os meus belos sonhos jamais seriam realizados. E foi assim, furiosa, que cheguei ao escritório.

Para minha raiva, minhas colegas ainda comentavam sobre ela. Linda, simpática, carismática, estes eram os adjetivos. Comecei a me sentir inferior, como se eu jamais conseguisse chegar aos pés dela e conquistar um homem como meu chefe. Fechei os olhos desejando ardentemente que ela morresse. E assim foi o dia inteiro. Meu amor chegou, comportou-se normalmente e atendeu algumas ligações que eu sabia serem dela. Naquele dia mal me deu bola. Nem olhou direito para mim. Tive vontade de chutar tudo, inclusive ele. Fui para casa me sentindo mal, muito mal.

Então tive uma ideia.

Peguei meu saco de retalhos e menos de duas horas eu tinha produzido uma bonequinha mal costurada, com fiapos de lã amarela fazendo de cabelos. Fiz rostinho tosco, roupas semelhantes a que a desgraçada vestia naquele dia. Minha mãe bateu na porta chamando-me para jantar. Eu respondi que dentro em 15 minutos estaria sentada à mesa com ela. Peguei uma tesoura bem afiada e cravei na boneca diversas vezes enquanto dizia morra, morra, morra.

Depois desta sessão de “tortura” senti um alívio grande. Abri a porta do quarto, jantei calmamente com a minha mãe e mais tarde dormi um sono maravilhoso.

No outro dia pela manhã me levantei bem disposta. Entrei no ônibus assobiando, pronta para mais um dia de trabalho. Aquele homem seria meu de uma maneira ou de outra. A vaca iria morrer.

Quando cheguei ao escritório, clima total de consternação. As pessoas falavam baixinho, todas com uma expressão de assombro e incredulidade. Larguei a bolsa em cima da mesa e me dirigi a uma das minhas colegas, curiosa e preocupada ao mesmo tempo:

− O que houve? Por que vocês estão deste jeito?
− Aconteceu uma tragédia, Cris.

Gelei. Meu Deus, que não fosse com ele! Por favor, Deus, que não tenha acontecido nada com ele. Senti-me empalidecer na hora e peguei com força o braço da colega. Devo-a ter machucado na minha ânsia de saber o que acontecera.

− Com quem? Diga logo!
− Foi com a Rebeca.
− Quem é Rebeca?
− A mulher do chefe. Ela foi assaltada ontem à noite. Reagiu e levou uma série de facadas.

Juro que tonteei. Precisei me agarrar na mesa para não cair.

− E…
− Ela morreu.
− Que coisa horrível – eu disse, sabendo que minha frase soara super falsa.

Pedi licença e fui até o banheiro. Me tranquei lá dentro e escorreguei pela porta devagarinho até chegar ao chão. Então comecei a rir. Ri descontroladamente até meu estômago doer.


Bem feito. Ele vai ser meu agora.

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