Ela foi levada
até a biblioteca da bela casa e ali ficou sentada e observada pelos olhares
ferozes de João. Menos de cinco minutos depois Marília chegou. O empregado se
empertigou todo ao ver a patroa.
— Dona Marília,
é esta a moça.
Ela fez um gesto
para que o empregado saísse e de repente ambas se viram a sós. Depois de alguns
segundos em um silêncio desconfortável, Marília finalmente perguntou:
— O que tanto
você faz chorando no túmulo do meu amado esposo?
A voz da viúva
era fria e seca, e Lucinda não soube o que responder.
— Gosto de
visitar velórios e frequentar cemitérios também. Foi sem intenção alguma que
apareci no velório do seu esposo e fiquei muito surpresa quando percebi o
quanto era jovem.
Marília deu uma
risada cínica.
— Que mentira
idiota. A quem você pretende enganar?
— Não, Dona
Marília! – Lucinda tentou se defender mesmo sabendo ser inútil. — É a mais pura
verdade! Fiquei penalizada. Eu nem conhecia seu esposo.
— Me diga uma
coisa. Você era amante do Álvaro?
A moça tomou um
susto e empalideceu.
— Mas que
pergunta descabida! Claro que não! Sequer o conheci em vida!
— Ele me amava
muito! – explodiu Marília em lágrimas. — Não posso acreditar que fui traída!
— Não, Dona
Marília! Isto nunca aconteceu! Apesar de os Malta serem conhecidos na região,
nunca cruzei com o falecido!
Marília enxugou
as lágrimas com um lenço de seda.
— Ele passou
muitos anos fora estudando e quando voltou para assumir os negócios do meu
sogro junto com o irmão acabamos por nos conhecer. Casamos muito rápido e… −
ela soluçou. —… perdi meu amor mais rápido ainda.
— O que
aconteceu realmente? – Lucinda desejava por demais conhecer os detalhes.
— Não sei.
Talvez ele já estivesse doente e não contou nada para não me preocupar.
Estávamos andando de bicicleta nos jardins da mansão quando ele caiu duro.
Pensei que fosse somente uma brincadeira.
Ela fez uma
pausa para chorar mais um pouco.
— Foi um ataque
do coração? – Lucinda perguntou baixinho, tocada pelas palavras de Marília.
— Não foi
possível identificar exatamente. Eu acredito que sim.
Lucinda olhou em
volta. Aquela havia sido a casa de Álvaro. Talvez sua alma ainda vagasse pelos
corredores.
— Coitado –
Lucinda secou as lágrimas que teimavam escorrer pelo rosto. — Não havia jeito
de salvá-lo?
Marília a
encarou, enfurecida.
— Claro que não!
Acha que deixaria meu marido morrer?
Lucinda
silenciou. Queria ir embora o mais rápido possível da mansão. Esperava que
depois daquela conversa a família Malta a deixasse em paz.
— Pare de ir ao
túmulo do meu esposo. Reze por ele na sua casa.
— Desculpe –
pediu Lucinda levantando-se ansiosa para sair dali. — Nunca tive a intenção de
incomodar.
— Olhando bem
para você – Marília a examinou de alto a baixo, — acho muito difícil que Álvaro
possa ter se interessado por alguém do seu tipo.
Lucinda ficou
tão surpresa com o comentário maldoso e grosseiro que não conseguiu responder.
Marília foi até a porta da biblioteca e a abriu.
— Julieta!
Uma mulher mais
velha que Lucinda apareceu quase na mesma hora.
— Pois não,
senhora.
— Leve esta
pessoa até o portão – Marília se voltou para Lucinda e se despediu secamente. —
Passe bem.
Lucinda não
respondeu e seguiu Julieta pelos jardins da mansão em silêncio, tensa com o
encontro. Antes que alcançasse o portão, a empregada voltou-se para ela de
repente e revelou, baixinho:
— Ela mentiu o
tempo todo para você.
Lucinda chegou a
piscar. Ainda dentro dos limites da casa ela sabia que todo cuidado era pouco.
— Como? O que
foi que você disse?
Olhando
rapidamente para os lados, Julieta aproximou-se um pouco mais de Lucinda,
temerosa que a conversa pudesse ser ouvida.
— Escutei tudo
através da porta. Dona Marília matou o Doutor Álvaro!
Foi como um
golpe no estômago. Lucinda recuou dois passos, atordoada. O ar fugiu do seu
rosto e ela precisou se apoiar em uma árvore próxima.
— Não é
possível!
— Ela envenenou
o esposo – Julieta tinha lágrimas nos olhos. — Percebi a falta do veneno na
véspera do ocorrido, mas não dei maior importância. No outro dia meu
patrãozinho morreu daquele jeito esquisito.
— Mas… por que
ela faria isto?
— Dinheiro –
Julieta transmitia as informações em tom de confidência. — A família de Dona
Marília está completamente falida. Eles investiram em negócios que deram errado
e o casamento com Doutor Álvaro foi por puro interesse. A bruxa nunca o amou.
Julieta estava
bem nervosa e Lucinda mais ainda. Então era tudo fingimento desde o velório?
— Não pode ser.
Você está segura disto?
A mulher
assentiu com a cabeça.
— A ordinária
está de romance com o cavalariço e o Doutor Álvaro estava bem desconfiado. Dois
dias antes da morte dele o casal teve uma briga séria e nós, os empregados,
suspeitamos que o casamento chegasse ao fim em breve. Mas nunca esperamos que
ela fosse capaz de cometer um… um assassinato!
A imagem de Álvaro
com a mão na garganta na ocasião em que ele aparecera no seu quarto esclarecia
as coisas para Lucinda. Os olhos angustiados do homem nada mais eram do que um
pedido de justiça.
Julieta
prosseguiu:
— Acreditamos
que ela deixará passar um tempo para poder casar com o cavalariço.
— Isto não pode
ficar assim!
— Por favor, nos
ajude. Procure o irmão do Doutor Álvaro, o senhor Henrique, e conte tudo!
— Eu não sei
quem ele é. Jamais ele acreditará em mim!
— Estamos muito
assustados! Tememos o que esta mulher pode fazer conosco. Por favor...
Lucinda percebeu
uma cortina se movimentar no primeiro andar da mansão. Era hora de ir embora.
— Preciso voltar
para casa. Prometo tentar fazer alguma coisa por vocês.
Ela apressou-se
a sair daquele lugar. O ambiente era carregado demais.
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