Todo o dia era sempre a mesma coisa. Me acordava às 6:30 da manhã, banho rápido, chapinha no cabelo, roupinha transada e partiu para a casa da Gabi, minha melhor amiga e confidente.
Temos 16 anos, estamos no último
ano do ensino médio. Nos suportamos desde os nove anos de idade, quando o
destino nos colocou na mesma sala de aula e sentadas uma ao lado da outra. Pode
se dizer que foi “amor à primeira vista”. Desde então não nos desgrudamos mais
e partilhamos todos os nossos segredos. Claro que temos outras amigas, mas eu e
Gabriela somos super parceiras. Nem tenho ciúme por ela ser mais bonita que eu.
A escola era perto das nossas
casas, portanto íamos sempre a pé, contando fofocas e sempre com muito assunto
mesmo nos vendo todos os dias. Quando cheguei ao prédio da Gabi ela já estava
lá embaixo. Ainda faltavam uns 20 minutos para a aula começar e isto
significava que não precisávamos ter pressa.
Na nossa classe estudavam também
duas garotas lindas. Sarah e Vanusa. Assim como eu e Gabi, as duas eram bem
amigas. A diferença é que também eram muito metidas. Ricas, volta e meia elas
apareciam – juntas ou separadas – em alguma coluna social, tanto na internet
como em jornal impresso. Todo mundo as paparicava.
Menos eu.
Eu não suportava as duas. E
apesar de a Gabi dizer a mesma coisa, sempre tive a impressão que lá no fundo
minha melhor amiga tinha vontade de fazer parte do grupinho delas. Não que ela
quisesse me deixar de lado. Apenas desejava estar no centro dos acontecimentos.
Eu, na verdade, queria que aquelas duas se explodissem. Nunca vou me esquecer
um dia que estava na porta da sala de aula e não vi que a ruiva Vanusa vinha se
aproximando. Não posso esconder de mim mesma que a desgraçada é linda com
aqueles cabelos vermelhos e o corpo perfeito. Mas eu a odeio não exatamente por
este motivo. Naquela manhã ela simplesmente não foi capaz de pedir licença e me
atropelou com a bolsa de marca famosa para entrar na sala. Fui deslocada para o
lado como se eu fosse um saco de batata. Fiquei furiosa. Aliás, eu fico furiosa
por muito pouco. O xingamento veio naturalmente aos meus lábios:
− Vá à merda!
Ela escutou e me ignorou
totalmente. Gabriela, que estava por perto, empalideceu e me deu um cutucão.
− Ei – disse Gabi sussurrando, −
você mandou a Vanusa à merda! Ela vai jogar os outros contra você! E contra
mim!
− Você acha que eu tenho medo
dela?
Aquele episódio quase arranhou
nossa amizade. Fiquei puta por Gabi dar importância aos sentimentos de Vanusa.
Mas deixei passar. Desde aquela vez passei a ignorar totalmente aquela dupla de
metidas. E elas pouco se importavam comigo. E com Gabriela.
Pois bem, como eu estava
falando, aquele dia começou como todos os outros. Chegamos à escola,
acomodamo-nos nas nossas classes – as vacas se sentavam do outro lado da sala
– e tudo correu bem até chegar o intervalo.
Como sempre, eu e Gabi fomos
para o pátio. Quando o dia estava bom, sempre havia um jogo na quadra. Daquela
vez era vôlei e um dos times era composto por Sarah e Vanusa. Elas jogavam
super bem para o meu desgosto.
Sentei na arquibancada
procurando com o olhar o Mateus, o gato da escola. Ele era um fofo. Louro,
estilo surfista, sempre com as roupas da moda. Tinha um defeito, contudo. Era
amiguinho das vadias, embora até onde eu soubesse nunca havia pegado nenhuma
delas. Não preciso dizer que ele jamais olhou para minha cara. De repente senti
um beliscão no braço.
− Ei, Paulinha. Está faltando
alguém no time delas.
− E eu com isto?
O jogo não havia começado ainda.
Havia um debate por estar faltando um integrante na equipe de Sarah e Vanusa.
Alguns defendiam que o jogo começasse assim mesmo, mas Sarah batia o pé e dizia
que aquilo não era justo e elas poderiam perder. De repente, para minha imensa
surpresa, Gabriela deu um salto do meu lado e perguntou em voz alta:
− Eu posso jogar?
Sarah e Vanusa a encararam e eu
tive certeza que minha amiga escutaria um sonoro “não”. Porém, ao contrário do
que eu imaginava, Vanusa fez um sinal positivo com a mão e Gabi entrou correndo
na quadra, totalmente empolgada. Eu cheguei a engolir em seco quando vi aquilo.
Mas naquele momento a única coisa que pensei foi em torcer pela Gabi se dar bem
ou a dupla a trucidaria.
A verdade é que nem eu sabia que
Gabi jogava vôlei direito. Das vezes em que a vi em ação, o seu desempenho
sempre tinha sido médio. Porém, ela se superou. Acertou saques, fez bloqueios e
o ponto decisivo. Fiquei desconfiada que Gabi se puxou para chamar a atenção
delas.
E conseguiu.
Quando o jogo terminou, aplaudi
e gritei o nome da Gabi. Ela nem me olhou. Estava distraída demais recebendo os
cumprimentos de Sarah e Vanusa no meio da quadra. Fiquei em pé assistindo
aquela cena, sem me conformar. As duas cercaram minha amiga e eu podia escutar
os elogios delas com suas vozinhas afetadas. Fiquei enojada. Logo depois Gabi
veio na minha direção, saltitante e com o sorriso de orelha a orelha. O sinal
tocou.
− Você viu? Eu fiz o ponto
decisivo!
Lógico que eu sorri amarelo.
Preferiria que Gabi tivesse jogado mal.
− Puxa, você jogou muito.
Eu não disfarcei que havia
odiado aquilo, entretanto Gabi simplesmente não notou. Ela me puxou pelo braço
e disse:
− Vamos até o banheiro antes que
a professora chegue na sala.
Fui seguindo Gabi até o banheiro
e ela não parava de falar. Elogiou direto tanto Sarah quanto Vanusa, sem se
importar com os meus sentimentos. Ela sabia muito bem o quanto eu detestava
aquelas asquerosas. Eu estava me mordendo de ciúmes.
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